Por onde andam as lendas do Hip Hop?

Muitos dos artistas que ajudaram a moldar o Hip Hop nos ano 80 e 90 ainda estão em plena atividade, nada mais justo do que olhar oque as lendas estão aprontando. Hoje vamos falar sobre: Kool Herc, Sharylaine, KRS-One, Lauryn Hill e GOG.

DJ Kool Herc

O DJ Jamaicano que fundou o Hip Hop e construiu a cultura dentro do movimento ainda rabisca seus discos até hoje, desde aquela primeira festa com sua irmã Cindy onde nasceu o Hip Hop o DJ nunca mais parou. Depois daquela festa em 1973 Kool Herc passou a tocar cada vez mais em outros locais espalhados pelo Bronx com seu coletivo The Herculoids, foi rabiscando os discos, promovendo o break dance e os MCs que o DJ Jamaicano se tornou um herói e referencia pra todo artista que surgia no movimento ainda nos anos 70.

Nos anos 80 Kool Herc tinha parado de discotecar pois as técnicas de produção tinham avançado muito com seus pupilos Afrika Bambaataa, Grandmaster Flash e outros… O DJ musicalmente parou no tempo  e passou a trabalhar em uma loja de discos, posteriormente seu pai veio a falecer e foi então que que Herc se viciou em crack no começo da década. Ainda nos anos 80 participou do clássico filme sobre Hip Hop Beat Street

Nos anos 90 Herc tocou pela primeira vez em um álbum lançado, foi no disco Super Bad do DJ Terminator X, conhecido pelos seus trabalhos com Public Enemy. Nos anos 2000 apareceu no como voz de introdução da música Elektrobank da banda inglesa The Chemical Brothers e participou da música Sacrifício no álbum ‘Sacrifício‘ do rapper Substancial. Atualmente vem sendo convidado para eventos que celebram o Hip Hop e registram a história do movimento, esteve no Brasil em 2013 no evento Block Out – Original Hip Hop em Ribeirão Preto SP comemorando 40 anos da cultura. Em 2019 lançou o seu primeiro disco de vinil Last of the Classic Beats com o DJ / produtor Mr. Green, surreal como o primeiro disco do fundador do Hip Hop saiu 46 anos depois dele ter criado o Hip Hop, vida longa ao DJ Kool Herc e toda sua trajetória que ainda continua viva.

Lauryn Hill

Uma das artistas da história começou sua história atuando em diversos filmes e séries norte-americanas, dentre elas estão Mudança de Hábito 2 – De Volta ao Convento, As the World Turns, O Rei do Pedaço e outros trabalhos. Ganhou notoriedade como vocalista do grupo Fugees que é responsável por inúmeros sucessos dos anos 90, o grupo lançou 2 álbuns e se separou em 1998, no mesmo ano Lauryn lançou seu aclamado e revolucionário disco solo The Miseducation of Lauryn Hill, o disco gravado diretamente da Jamaica no Museum/Studio do Bob Marley.

No inicio dos anos 2000 Lauryn se afastou dos holofotes, chegou até a lançar o projeto do seu um álbum ao vivo MTV Unplugged No. 2.0 para a MTV mas depois se isolou de toda a mídia e indústria da música, estava inclusive escrevendo um roteiro para um filme sobre o Bob Marley e outros projetos mas encerrou todos eles.

Eu me sentia desconfortável por ter que sorrir na cara de alguém quando eu realmente não gostava dela ou mesmo conhecia bem o suficiente para gostar dela [..] Por dois ou três anos eu estive longe de toda interação social. Foi uma época muito introspectiva porque eu tive que confrontar meus medos e dominar cada pensamento demoníaco sobre inferioridade, sobre insegurança ou o medo de ser negro, jovem e talentoso nesta cultura ocidental.

Lauryn Hill em entrevista a revista Essence em 2006

O grupo Fugees voltou a se apresentar em diversos festivais pelo mundo até encerrar novamente as performances em 2009 mas deu tempo de passar pelo Brasil em 2007 e posteriormente shows solos da Lauryn em 2010 e 2019, por todos esses anos Lauryn nunca parou de escrever e seu ex-marido Rohan Marley (o quinto filho de Bob Marley) revelou em uma entrevista que: “Ela escreve música no banheiro, no papel higiênico, na parede. Ela escreve no espelho se o espelho fumegar. Ela escreve constantemente. Essa mulher não dorme”. Lauryn sempre costuma cantar musicas inéditas em seus shows mas acaba nunca lançando elas, também está constantemente gravando em estúdio,  porém o resultado dessas sessões só Deus sabe se vão sair algum dia ou não.

Em 2012 participou de uma turnê com o rapper Nas em que a parte de Lauryn no show se chamava Black Rage, o mesmo nome da música que ela ‘”lançou” naquele ano como inédita somente em suas performances descrevendo-a como: “Sobre os efeitos derivados da desigualdade racial e abuso”. Em 2013 Lauryn lançou seu primeiro single depois em mais de uma década, Neurotic Society (Compulsory Mix) porém no mesmo ano foi presa por fraude fiscal por não apresentar impostos. em 2015 Hill deveria gravar duas faixas para o documentário biográfico de Nina Simone “What Happened, Miss Simone?” mas acabou gravando 6 faixas que estão no álbum NINA REVISITED: A Tribute to Nina Simone, até então é o projeto mais concreto lançado desde seu primeiro álbum em 1998. Lançou em 2018 sua própria coleção de roupas American Soul sendo estilista e modelo com a marca Woolrich.

Confira a ultima música lançada até então pela Ms. Lauryn Hill, em 2019 ela gravou finalmente uma versão de estúdio da sua música Guarding the Gates, som esse que só aparecia em shows e que foi gravada para estar presente no filme “Queen & Slim” lançado ainda em 2019. Viva Ms. Lauryn Hill.

KRS-One

Certamente um dos maiores MCs entre todos os mestres de cerimonia do mundo e considerado por muitos o professor do Hip Hop, KRS-One começou sua carreira no grupo Boogie Down Productions onde lançou 5 álbuns (1986-1992) que ajudaram a moldar e explorar muitas estruturas do Rap, o grupo se tornou famoso por sua conexão musical muito forte com a Jamaica e todas aquelas letras de cunho social que carregaram toda a trajetória dos integrantes. Depois do encerramento do grupo KRS-One seguiu carreira solo e em 1993 já lançou seu primeiro disco Return of the Boom Bap, foi um sucesso gigantesco e é considerado um dos melhores discos de Rap já lançados, só pra se ter ideia a música ‘Sound of da Police’ que faz parte do disco é usada até hoje em filmes, séries, festas e etc.

Ainda nos anos 90 KRS-One lançou mais 2 discos: KRS-One (1995) e I Got Next (1997). Já nos anos 2000 o MC começou a desenvolver muitos projetos com a intenção de preservar a cultura Hip Hop, a real é que ele já fazia isso há muito tempo desde o movimento Stop the Violence que tinha a intenção de acabar com a violência desenfreada nas comunidades negras, tem também o Templo de Hip Hop que é um ministério, arquivo, escola e sociedade para promover a cultura Hip Hop, enfim… De fato ele sempre fez muito pela cultura.

Na primeira década dos anos 2000 KRS-One lançou 7 álbuns e ainda participou de mais 4 outros, lançou também seu livro The Gospel of Hip Hop em 2009 no qual ele descreve em diversas mídias: “Estou sugerindo que em 100 anos, este livro será uma nova religião na terra […] Eu posso me aproximar de Deus diretamente, então escrevi um livro chamado O Evangelho do Hip Hop para me livrar de todo esse lixo sem sentido agora. Eu respeito o Cristianismo , o Islã , o Judaísmo mas seu tempo acabou. Em cem anos, tudo o que estou dizendo a você será de conhecimento comum e as pessoas ficarão tipo, ‘Por que ele teve que explicar isso? Não era óbvio?”. Em 2014 participou da música ‘Hip Hop Chronicles‘ com o MC Brasileiro Zamba e com o grupo colombiano NeckBreakerz.

O MC que incessantemente tenta preservar o Hip Hop já participou de 31 filmes/séries ao longo de sua carreira, nessa segunda década do século já lançou 6 álbuns sendo que o ultimo que saiu não tem nem 1 mês nas ruas ainda, o álbum Between Da Protests conta com 13 faixas e trás todo aquele calor dos protestos contra a brutalidade policial nas comunidades negras para a discussão de fato, musicalmente falando chega a ser impressionante ver o como KRS-One ainda se mantém um dos melhores MCs mesmo com toda essa juventude lançando hit atrás de hit, talvez seja esse o motivo dele se manter no auge por tanto tempo, não se comparar e manter o foco na missão dele, vida longa KRS-One.

Sharylaine

Nascida na Zona Leste de São Paulo a rapper Sharylaine conhece o movimento Hip Hop por dentro em cada detalhe, a artista tem uma importância enorme na história do Rap Nacional pois ajudou a construir a cultura Hip Hop no Brasil sem falar em todo seu pioneirismo quanto mulher dentro do movimento e os projetos/músicas criadas. Em 1985 Sharylaine conheceu a grupo de Breaking Nação Zulu que a fez se apaixonar por aquela cultura ainda em desenvolvimento, a cultura que abraçava dançarinos, DJs, MCs e grafiteiros de varias comunidades a sua volta. Rapidamente em 1986 junto com City Lee a Sharylaine formou o grupo Rap Girls, O primeiro grupo de Rap no Brasil apenas com mulheres que foi até 1989.

Comecei a trocar as palavras que apareciam no masculino para o feminino. A partir disso, comecei a cantar junto com a minha prima.

Comentou Sharylaine em uma entrevista ao jornal Alma Preta

No começo dos anos 90 participou da clássico álbum/coletânea Consciência Black Vol.1, mesmo disco que lançou os Racionais MCs pelo selo Zimbabwe Records, tendo em vista a dificuldade de se lançar álbuns na época o Consciência Black Vol.1 se tornou um marco não só para o Rap Nacional mas principalmente para muitos outros artistas e ouvintes negros por todo Brasil, e assim a Sharylaine foi construindo sua carreira: “Eu comprava discos com instrumental e fazia as minhas letras sobre essas bases. Mesmo sem um disco próprio, os baileiros me chamavam para os shows” Sharylaine ao jornalista Juca Guimarães

Ao longo dos anos 2000 continuou promovendo projetos para a fortalecer as mulheres dentro do Rap e fazendo suas performances pra lá de especiais em muitos eventos que celebram a história do Hip Hop no Brasil, nesse sentido surgiram projetos como o Minas da Rima e em 2010 um dos mais importantes e consistentes movimentos dentro do Hip Hop, Sharylaine é idealizadora do Frente Nacional de Mulheres no Hip Hop (FNMHH) com presença em boa parte do território nacional: “O objetivo da Frente Nacional de Mulheres no Hip Hop é voltar os holofotes às mulheres negras no rap, que ainda são sabotadas e prejudicadas pelo racismo institucional existente no mundo da música. Nós nos preocupamos também com o aumento da diversidade nesse cenário”, Disse Sharylaine e em entrevista ao jornal Alma Preta.

Em 2018 lançou o videoclipe da música Sou Jovem presente no álbum SOU SOUL que pretende ser uma coletânea das principais canções de sua carreira, e em 2020 se tornou interprete da escola de samba Flor De Vila Dalila, oque já era um sonho por todo envolvimento do seu pai com o Samba e sua paixão de infância pelo gênero que é pai do Rap no Brasil. Viva Sharylaine, Viva o Rap Nacional.

Assista também a  entrevista de Sharylaine ao nosso canal no Youtube:

GOG

Um dos pioneiros do Hip Hop no centro do país, GOG nasceu e cresceu em Brasília e foi lá que começou a se tornar referencia dentro do movimento, em um começo de carreira parecido com da Sharylaine o GOG começou se apaixonando pela Black Music e assim conhecendo o grupo de dança Magrello’s Pop Funk que posteriormente se tornou o grupo de Rap Os Magrello’s. Com grande influência da presença da dupla paulista Thaíde e DJ Hum em BSB o GOG começou a rimar e em 1990 participou da coletânea Rap Ataca a convite do DJ Leandronik e assim gravou sua primeira música ‘A Vida‘, mas é depois do lançamento do álbum Peso Pesado em 1992 que seu nome começa a ganhar notoriedade pelo país.

Ainda nos anos 90 lançou o primeiro selo nacional voltado ao Hip Hop, o Só Balanço e também mais 4 outros discos, depois da coletânea ‘GOG Convida‘ de 1999 o rapper apareceu em 2004 com o disco vencedor do Prêmio Hutúz de ‘Melhor Disco Do Ano’, o aclamado Tarja Preta. Ao longo dos anos 2000 gravou DVD, participou de CDs, coletâneas acústicas e continuou ganhando prêmios pelos 11 álbuns e 4 coletâneas de sua carreira. Em 2010 ainda lançou seu primeiro livro chamado A Rima Denuncia com diversas frases e músicas da sua grandiosa carreira dentro do Hip Hop.

Tendo lançado o ultimo disco em 2017 o GOG continua ativo na luta sempre em contato com seu publico, ele é um dos artistas mais ativos e conectados de todas as gerações do Hip Hop, sempre está em live conversando e abrindo diálogos com a comunidade, sempre presente acompanhando a nova safra do Rap Nacional, continua lançando muita música e inclusive fez uma live recente com cantando muitos de seus sucessos como África Tática, Brasil comP, Assassinos Sociais e muito mais. Vida longa ao poeta GOG.

O Hip Hop evoluiu muito quanto movimento/comunidade e hoje a cultura vive dentro de muitos seres espalhados pelo mundo, que se conectaram de uma forma quase divina com os passos do B-Boys/B-Girls, as rimas dos MCs, as rabiscadas dos DJs e as telas urbanas dos Grafiteiros, é necessário fazer a voz dos jovens artistas serem ouvidas pois essa foi a luta por anos dos fomentadores do Hip Hop no Brasil e no mundo, mas também é essencial que todos aqueles que abriram caminho pra essa cultura quando tudo ainda era mato sejam lembrados, respeitados e tratados com muito carinho pois são eles os responsáveis por criar e desenvolver esse movimento revolucionário até os dias de hoje. Viva o Hip Hop, Viva Kool Herc, Sharylaine, KRS-One, Lauryn Hill, GOG e todos os outros mestres.